“Deixe em paz meu coração
que ele é um pote até aqui
de mágoa. E qualquer desatenção
faça não, pode ser a gota d’água..”
(Chico Buarque)
É necessária uma reflexão sobre os movimentos de rua que estão se alastrando pelo Brasil e em vários países do mundo. Será a falência do capitalismo? Ou a incompetência generalizada dos governantes? Ocorre, principalmente em nosso país, que a população vai aos poucos se revoltando com os desmandos governamentais, a corrupção e, principalmente, a impunidade.
A criminalidade avança sem freios, e a policia, tão ágil na repressão às passeatas, não consegue colocar ou imprimir a mesma repressão ao crime organizado. Os assaltos se sucedem cada vez com maior frequência, os assassinatos e latrocínios avançam nas estatísticas, e ninguém adota posturas ou legislação mais avançadas para dar segurança ao povo.
É transparente que os protestos contra o aumento das passagens de ônibus é apenas um mote através do qual o povo faz desaguar sua insatisfação com a corrupção, a impunidade, o pouco caso dos governantes com as questões sociais, culturais e outras.
Faz-me lembrar de maio de 1968, quando os estudantes franceses foram às ruas de Paris e Nanterre, na luta por reformas no setor educacional. Este movimento evoluiu tanto, que uniu os operários e promoveram a maior greve da Europa com uma participação de nove milhões de pessoas.
Sob o comando de Daniel Cohn-Bendit, no dia 6 de maio de 1968, passeata convocada pela União Nacional dos Estudantes da França, e pelo Sindicato dos Professores Universitários, tendo como mote principal a invasão da Sorbonne pela polícia, os mais de dois mil participantes avançaram em direção à Sorbonne, quando foram violentamente reprimidos pelo aparato policial. A partir daí o movimento cresceu e acabou que De Gaulle, então Presidente da França, terminou por renunciar um ano após o inicio desses conflitos.
Os movimentos iniciados em São Paulo, e que hoje se espalham por todo o país, não pode ser tratado com o cassetete da ditadura disfarçada em que hoje vivemos. Nossos governantes se acostumaram a viver muito bem e a maquiar estatísticas e resultados de projetos, achando sempre que a mentira tem vida longa.
Ocorre que a verdade, como diziam nossos antepassados, é como o azeite. Você joga uma gota de azeite na água, ela vai ao fundo do copo, mas sempre retorna para a superfície.
Cada estudante que apanha de um policial despreparado, tem atrás de si uma família que vai se tornar inimiga do governo. Quando um oficial manda quebrar o vidro da viatura para colocar na conta do vandalismo, para poder ter motivo de descer a borracha, está contribuindo para o acirramento dos ânimos.
A verdade é que ninguém aguenta mais pagar tantos impostos, e ter como troca um ensino retrógrado e superado, uma saúde caindo pelo esgoto, e uma total desatenção governamental.
Está na hora de repensar o Brasil, e isto é o que todos nós queremos. Todos nós carregamos mágoas e sentimentos malévolos contra essa politicalha barata que infesta o cenário do país. Estas passeatas podem ser a gota d´água. Olhem o exemplo do De Gaulle.