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Bússolas ao Mar

Voltar para listagem de colunas Inserida em: 21/12/2010 Colunista: Alexandre Martins Joca

Nos últimos anos venho dedicando esforços em tentar compreender e contribuir com as questões relacionadas aos conflitos vividos no campo da sexualidade humana, especialmente, no debate sobre os saberes, as “verdades”, atribuídos ao sexual e aos conflitos sociais oriundos deste conflito.

Para isso, faz-se necessário entender a sexualidade, aliada aos demais aspectos sociais que fundamentam e estruturam as relações humanas (relações de poder, política, crenças religiosas, ideologia dominante, economia, cultura, etc.) constituindo alicerces das sociedades, ou seja, pressupostos fundamentais para a convivência social e coletiva entre os sujeitos.

Neste emaranhado de aspectos sob os quais a convivialidade e/ou sociabilidade humana está submetida, a sexualidade perpassa pelos conhecimentos, ou se preferir, pela construção de “verdades”, sobre os sujeitos e o mundo.

Tal afirmação parte da compreensão de seu entendimento para além do ato sexual, para além do essencialismo biológico centrado na reprodução da espécie, ao observar a sexualidade como um aspecto fundamental no desenho do corpo social. Neste prisma, podemos definir a sexualidade humana como um dos muitos fios que desenham a cartografia do corpo social.

No entanto, ao olharmos este mapa, no sentido de compreendermos o sujeito e o mundo, a partir dos saberes sobre o sexual, ele nos interpela constantemente no recriar de novas possibilidades, de novas rotas, de sujeitos e de mundo.

Adentrando os aspectos constitutivos da sexualidade humana: sexo, gênero, homem, mulher, identidade, prazer, pecado, família, amor e poder, são peças deste desenhar em constante mutação no percurso da dinâmica social.

Na medida em que os construtos culturais as redesenham, criam-se novos mapas, novos caminhos, novas trilhas, ressignificando valores, saberes e práticas sexuais e sociais.

Na cultura ocidental cristã, o sistema sexual binário, baseado na construção do feminino e do masculino, padronizador do “ser homem” e “ser mulher”, sob a dominação da masculinidade e a hegemonia da heterossexualidade, tem gerado conflitos e transformações sociais a partir do enfrentamento das desigualdades ocasionadas por essa lógica.

A dominação do homem branco, heterossexual e viril, dita, às mulheres e aos sujeitos homossexuais o estigma da inferioridade na vivência das relações sociais. A partir desta premissa, as transformações sociais, neste campo, têm ocasionado uma incessante “revolução” de paradigmas, protagonizadas, principalmente, nos últimos séculos, pelas mulheres no movimento feminista e recentemente por lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais no movimento LGBT.

É verdade que as desigualdades estabelecidas pelo sistema binário ainda hoje são reafirmadas na cor de nossas roupas, nas palavras que pronunciamos, em nossos gestos e atitudes cotidianas. Os conflitos decorrentes desse contexto são vividos cotidianamente por LGBT no que se refere à sexualidade e aos modos de vivê-la em sociedade.

No extenso campo que envolve a sexualidade humana e as relações sociais oriundas dos significados e sentidos atribuídos ao sexual, minha intenção maior tem sido vislumbrar as possibilidades de desenvolver uma pedagogia sob a perspectiva do enfrentamento aos preconceitos e discriminações decorrentes do sexismo e da homofobia (ódio e/ou aversão à homossexualidade e aos homossexuais), que caracterizam o atual cenário de desigualdades sociais.

Entendo que as questões postas neste texto sintetizam as bases dos muitos “nós” que nos desafiam constantemente.

Na seqüência de textos desta coluna, da qual este inicia, sem muitas pretensões, pretendemos abordar alguns aspectos inerentes aos conhecimentos sobre a sexualidade humana, no intuito de refletirmos possíveis práticas que possibilitem o traçar de novas linhas e desenhos, de novos mapas e rotas, no ressignificar dos sentidos sobre o “eu” e o mundo, tal um navegante sem bússolas: Será possível?